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Histórias do Mundial: Zidane termina a carreira com uma cabeçada no Mundial de 2006 (2022)

Histórias do Mundial: Zidane termina a carreira com uma cabeçada no Mundial de 2006 (2022)

Com o Mundial de 2022 no Qatar a ser disputado, estamos a olhar para os momentos que marcaram o Mundial de futebol e que permanecem até hoje na nossa memória, sejam eles bons ou maus.

No dia 9 de Julho de 2006, a Itália e a França enfrentaram-se na final do Mundial de futebol no estádio Olympiastadion em Berlim. O jogo teve direito a prolongamento e foi nesta parte do jogo que um momento inesperado aconteceu. O lendário jogador francês Zinedine Zidane, três vezes jogador do ano da FIFA, surpreendeu tudo e todos ao dar uma cabeçada ao italiano Marco Materazzi. Estes acabaram por ser os últimos momentos de Zidane como jogador de futebol profissional, terminando uma carreira brilhante que acabou ofuscada por este momento.

Zidane: Real Madrid e o Mundial de 2006

Antes do início do Mundial de 2006, Zidane já tinha mostrado a sua vontade de se reformar após o Mundial, muito devido a uma lesão que tinha sofrido há cerca de 18 meses. Em conversa com o Canal+, ele disse: “A decisão é minha e é final. Depois do Mundial de Futebol, vou deixar de jogar futebol. O Mundial de futebol é o meu último golo. É a única coisa em que me quero concentrar. Eu quero que as pessoas saibam antes do Mundial de futebol”.

Zidane tinha 33 anos quando foi chamado pela última vez para vestir a camisola da seleção francesa. O jogador tinha acabado de terminar a temporada de 2005/2006 no Real Madrid e foi muito aquém do que se esperava. O seu desejo de ganhar o título do La Liga não se tornou realidade, e o Real Madrid terminou o campeonato em segundo lugar, atrás do rival Barcelona. Na Copa del Rey as coisas não correram melhor e foram eliminados num jogo contra o Real Zaragoza. Na Liga dos Campeões foram eliminados pelo Arsenal, acabando com as esperanças de sucesso de Zidane no final da sua carreira.

O fim da sua carreira estava repleto de frustrações e era visível que o auge já tinha sido atingido. Zidane não ganhava um troféu importante desde a vitória do Real Madrid na liga espanhola em 2003 e a vitória da Liga dos Campeões em 2002. Por isso, o Mundial de 2006 era o momento perfeito para Zidane terminar a sua carreira com distinção.

A França chega com grandes expectativas

A França foi a equipa mais bem classificada da FIFA na Europa em 2006, mas apesar de ter liderado o grupo de qualificação da UEFA que partilhou com a Suíça, Israel, República da Irlanda, Chipre e Ilhas Faroé com um recorde imbatível, o seu desempenho não foi convincente. Os franceses marcaram 14 vezes em dez jogos durante a fase de qualificações e empataram metade desses jogos. Zinedine Zidane marcou apenas uma vez, já no final do jogo contra o Chipre em Saint-Denis.

A seleção francesa tinha ganho o Europeu de 2000 e em 2006, Raymond Domenech, como treinador queria conjugar da melhor forma possível os talentos que a seleção francesa tinha. Jogadores como o Patrick Vieira, Thierry Henry, Sylvain Wiltord, Lilian Thuram, Fabien Barthez, David Trezeguet tiveram grande sucesso com Zindane no Euro 2000 e todos estes jogadores estariam presentes seis anos mais tarde no seu último jogo. Num dos jogos da fase de grupo contra a Coreia do Sul, Domenech nomeou a equipa com a maior média de idade (30.8) em todo o Mundial. Isto significou que não era só Zidane que queria usar esta competição para mostrar todo o seu talento e despedir-se em grande do futebol. Todos os outros jogadores pretendiam fazer a sua melhor exibição para terminar a carreira da melhor forma.

Mundial de 2006: A França a abrir caminho

A França defrontou a Suíça no primeiro jogo da fase de grupos. A 13 de Junho, as duas equipas do Grupo G defrontaram-se em Stuttgart num jogo que acabou empatado a 0. Cinco dias depois, a 18 de Junho, os franceses voltaram a não conseguir ganhar, desta vez contra a Coreia do Sul. Apesar de aos 9 minutos a França ter conseguido arrancar em vantagem com um golo de Thierry Henry, o jogador sul-coreano Ju-Sung Park marcou um golo quando faltava apenas 9 minutos para o fim do jogo, um momento de simetria desportiva. 

Esse ponto do empate colocou a Coreia do Sul à frente do Grupo G, mas a seleção asiática acabaria por perder essa posição após perder por 2-0 contra a Suíça. A seleção suíça passou para a primeira posição do grupo e a França assumiu o segundo lugar, deixando atrás a Coreia do Sul e o Togo. No jogo frente ao Togo, França precisava de pelo menos dois golos de vantagem para garantir a passagem aos oitavos de final e acabou por conseguir essa proeza com um golo de Patrick Vieira e outro de Thierry Henry, sem sofrer nenhum. Zidane fazia anos no dia do jogo, mas acabou por não poder jogar porque tinha recebido cartões amarelos nos jogos anteriores, o que resultou na proibição para o terceiro jogo.

O central tinha sido substituído no jogo contra a Coreia do Sul e saiu do campo visivelmente irritado, alimentando rumores de que estavam de costas voltadas com o treinador Domenech. O treinador francês fez questão de dizer que tudo estava bem e que não havia qualquer problema entre os dois, dizendo “É pura especulação, já passaram dois anos desde que falaste sobre isso. Queres que eu invente algo para te dizer o contrário? Não te posso dizer mais nada. Encontra-me um jogador que fique feliz por deixar o campo com um jogo em suspenso como aquele”. No entanto, apesar destes argumentos Zidane não parecia nada feliz.

A França a caminho da final

Com Zidane de volta aos jogos, a França foi a Hannover defrontar a Espanha, onde Zidane ia encontrar os companheiros do Real Madrid: Iker Casillas e Raul. 

A Espanha recebeu um penálti aos 28 minutos por causa de uma placagem de Lilian Thuram. O penálti resultou num golo de David Villa e a equipa espanhola ganhou vantagem no jogo. Aos 41 minutos, a França conseguiu chegar ao empate com um golo de Franck Ribéry. Depois de uma intensa segunda parte e sem golos à vista, Vieira acaba por marcar aos 83 minutos e coloca a França à frente. Poucos minutos depois e mesmo em cima do apito final, Zidane marca o terceiro golo da França.

Com esta vitória contra a Espanha, a França sentiu a confiança que precisava para defrontar o Brasil nos quartos de final. Com Ronaldo, Ronaldinho e Kaká, entre outros, a seleção brasileira era um grande desafio para a França.

No jogo contra a França, Zidane assistiu o único golo do jogo que foi marcado por Thierry Henry. Após o jogo, o treinado francês Raymind Domenech deixou rasgados elogios a Zidane, dizendo “Acho que ele está a jogar assim precisamente porque se está a reformar. Ele pode jogar com liberdade e expressão, porque sabe que cada jogo pode ser o seu último”.

Apesar de terem sido apelidados de velhos no início do Mundial, a experiência dos jogadores estava a dar frutos. Ao jogar contra Portugal nas meias-finais, a França era vista como a favorita à vitória. Na preparação para o jogo, o defesa francês William Gallas tinha avisado que os portugueses tentariam destabilizar a França com pequenas faltas, por isso foi irónico que o jogo tenha sido decidido por um penálti atribuído à França. Aos 33 minutos, Ricardo Carvalho derrubou Thierry Henry dentro da grande área e o árbitro assinalou penálti. Zidane acertou em cheio na baliza e este penálti levou a França à final. 

Final do Campeonato do Mundo de 2006: Zidane torna-se o centro das atenções

O Olympiastadion em Berlim era o palco do frente a frente entra a França e a Itália. O jogo começou logo com uma falta de Materazzi contra o francês Florent Malouda que resultou em penálti. Zidane foi o responsável pelo remate do penálti e colou a França à frente no jogo. 

Apenas 12 minutos depois, Materazzi igualou o jogo com uma cabeçada de canto com a assistência de Andrea Pirlo. A partir daí, o jogador fez marcação cerrada a Zidane para evitar que ele colocasse a França novamente a ganhar. O jogo do gato e rato continuou até ao apito final e até ao tempo extra, enquanto ambas as equipas davam o seu melhor para furar a defesa da equipa adversária. Aos 112 minutos, enquanto Zidane corria de volta para o meio-campo após um ataque falhado, o capitão da seleção francesa parou por um momento para reagir a um sussurro de Materazzi.

O que se seguiu foi um dos momentos mais inexplicáveis do Mundial de 2006, mas também de todos os outros. Ofendido com os comentários, Zidane inclinou-se para a frente e deu uma cabeçada no peito a Materazzi, atirando-o para o chão e contando com uma pitada de drama do jogador italiano que claramente dramatizou a situação. Zidane aguardou calmamente a decisão do árbitro que demorou cerca de dois minutos a decidir, até porque não tinha visto bem o incidente e precisava da ajuda do árbitro assistente para saber se era necessário um cartão vermelho.

Zidane saiu do campo com todos em choque, tal foi a surpresa desta situação. A França, com apenas dez jogadores, continuou a dar tudo e o jogo seguiu para penáltis. O jogo acabou por terminar com a vitória da Itália que acertou cinco penáltis, contra os três da França.

Mais tarde, Materazzi revelou que palavras é que Zidane lhe sussurrou e porquê da sua reação agressiva. O jogador disse que “Tinha havido um pouco de contacto entre nós na grande área. Ele tinha marcado o golo da França na primeira parte e o nosso treinador [Marcelo Lippi] disse-me para o marcar. Depois daquele primeiro momento entre nós, eu pedi desculpa, mas ele reagiu mal. Depois do terceiro confronto, ele disse “Eu dou-te a minha camisola mais tarde”. Eu respondi que preferia ter a irmã dele do que a camisola”. 

O próprio Zidane nunca deu grandes explicações para a cabeçada. Em 2022, quando lhe perguntaram se tinha algum arrependimento, ele respondeu: “Não estou nada orgulhoso do que fiz, mas faz parte do meu passado”. A maior tragédia de todas talvez seja o facto de Zidane ser lembrado pelo seu momento de loucura no Mundial de 2006 e não por toda a sua carreira brilhantes, por isso este sim, parece ser um verdadeiro castigo.